Ó Lua, espelho do chão que andas no céu pendurado holofote da ilusão pelo turismo alugado não ilumines em vão os sulcos do empedrado!
Denuncia nas valetas as sombras que tu arrastas prostitutas, proxenetas silhuetas de pederastas Colos brancos. Rendas pretas Casas tortas. Pedras gastas
As rugas do sobressalto Ó Lua não as destruas! Tu viste carros de assalto rondarem por estas ruas viste rolarem no asfalto vestes mais alvas que as tuas
Foste a lua a que se expunha aos tiros a multidão espelhaste na tua unha a secular aflição e já foste testemuha dos fogos da Inquisição
Procissões do Santo Ofício Fileiras de condenados À noite, nem só o vício rasteja por estes lados as serpentes do suplício silvam nos pátios murados
Ó Lua, guarda o retrato de tudo, tudo a que assistas! Não queiras passar ao lado da desgraça que visitas! Nem queiras ser infamado passatempo de turistas!
Clorofórmio dos enfermos se foges dos hospitais então recolhe-te aos ermos desertos celestiais! E quando te não merecermos não te acendas nunca mais!
Gaivota - Amália Rodrigues
Se uma gaivota viesse trazer-me o céu de Lisboa no desenho que fizesse nesse céu onde o olhar é uma asa que não voa esmorece e cai no mar
Que perfeito coração no meu peito bateria meu amor na tua mão nessa mão onde cabia perfeito o meu coração
Se um português marinheiro dos sete mares andarilho fosse quem sabe o primeiro a contar-me o que inventasse se um olhar de novo brilho no meu olhar se enlaçasse
Que perfeito coração morreria no meu peito meu amor na tua mão nessa mão onde perfeito bateu o meu coração
Que perfeito coração no meu peito bateria meu amor na tua mão nessa mão onde cabia perfeito o meu coração
Que perfeito coração no meu peito bateria meu amor na tua mão nessa mão onde cabia perfeito o meu coração
Perfeito o meu coração Perfeito o meu coração
Balada Do Mangue-Vinicius De Morais
Pobres flores gonocócicas Que à noite despetalais As vossas pétalas tóxicas! Pobre de vós, pensas, murchas Orquídeas do despudor Não sois L? lia tenebrosa Nem sois Vanda tricolor Sois frágeis, desmilingüidas Dálias cortadas ao pé Corolas descoloridas Enclausuradas sem fé Ah, jovens putas das tardes O que vos aconteceu Para assim envenenardes O pólen que Deus vos deu? No entanto crispais sorrisos Em vossas jaulas acesas Mostrando o rubro das presas Falando coisas do amor E às vezes cantais uivando Como cadelas à lua Que em vossa rua sem nome Rola perdida no céu Mas que brilho mau de estrela Em vossos olhos lilases Percebo quando, falazes Fazeis rapazes entrar! Sinto então nos vossos sexos Formarem-se imediatos Os venenos putrefatos Com que os envenenar Ó misericordiosas! Glabras, glúteas caftinas Embebidas em jasmim Jogando cantos felizes Em perspectivas sem fim Cantais, maternais hienas Canções de caftinizar Gordas polacas serenas Sempre prestes a chorar Como sofreis, que silêncio Não deve gritar em vós Esse imenso, atroz silêncio Dos santos e dos heróis! E o contraponto de vozes Com que ampliais o mistério Como é semelhante às luzes Votivas de um cemitério Esculpido de memórias! Pobres, trágicas mulheres Multidimensionais Ponto morto de choferes Passadiço de navais! Louras mulatas francesas Vestidas de carnaval Viveis a festa das flores Pelo convés dessas ruas Ancoradas no canal? Para onde irão vossos cantos Para onde irá vossa nau? Por que vos deixais imóveis Alérgicas sensitivas Nos jardins desse hospital Etílico e heliotrópico? Por que não vos trucidais Ó inimigas? ou bem Não ateais fogo às vestes E vos lançais como tochas Contra esses homens de nada Nessa terra de ninguém!
Saudades Do Brasil Em Portugal-Vinicius
O sal das minhas lágrimas de amor Criou o mar que existe entre nós dois Para nos unir e separar Pudesse eu te dizer A dor que dói dentro de mim Que mói meu coração nesta paixão Que não tem fim Ausência tão cruel Saudade tão fatal Saudades do Brasil em Portugal
Meu bem, sempre que ouvires um lamento Crescer desolador na voz do vento Sou eu em solidão pensando em ti Chorando todo o tempo que perdi